A indústria actual alimenta-se de grandes investimentos em títulos AAA que têm de ter resultados rápidos. O investimento cresce, os blockbusters dos videojogos estão cada vez mais caro e os franchises mais populares nem sempre são os mais inovadores ou os que oferecem uma experiência adequada à geração. Exemplo óbvio é "Call Of Duty" e os sucessivos vídeos masturbatórios de tech specs sobre grandes inovações que não são especialmente admiráveis e que ficam regularmente aquém de outros títulos. Mas a mensagem passa, afinal o consumidor tipo de "Call Of Duty" está a cagar-se para o resto. Eu também estou quando jogo "Call Of Duty".
Esse investimento exponencial e a possibilidade dos jogos serem comercializados digitalmente proporcionou o crescimento dos jogos indie nos mercados digitais das consolas - e não só, mas no PC isso já existia - e, claro, o surgimento de títulos que concorreram taco a taco com títulos milhares de vezes mais caros. Não pelos gráficos - embora isso até se possa contestar em certos casos - mas essencialmente pelo desenvolvimento de uma linguagem "nova" de jogabilidade. As aspas são o ponto de partida para ideia errada de retrogaming: o que acontece com muitos destes jogos não é uma fantasia retro, mas a criação de uma série de narrativas e modos de abordagem que anteriormente - há 20-30 anos - seriam impossíveis.
Os gráficos são um reflexo sensorial da memória. Queremos hoje em dia tudo tão polido que nos esquecemos que isso não é tudo. O cinema mudo fora do tempo em que não havia som não tem de ser revivalista nem uma moda, é apenas uma de muitas possibilidades que existem para comunicar/transmitir/criar algo. O resto é branding/publicidade. Os videojogos aperceberam-se disto em menos tempo, porque hoje também tudo se desenvolve mais rapidamente do que há cem anos, mas porque também é um veículo de criação que pode ser menos dependente (principalmente a nível de força humana) do que o cinema.
E, sobretudo, porque muito dos criadores actuais - também do passado, como é óbvio - começaram por sê-lo pouco depois de terem começado a jogar. Isso faz toda a diferença. O que também faz toda a diferença é que o passar o tempo com um videojogo é totalmente diferente de qualquer outra forma de entretenimento: não estamos particularmente condicionados e somos, efectivamente, controlados e controladores. E isso proporciona uma experiência afectiva diferente, que não passa tanto pelo que nos é visualmente transmitido mas também pela memória, memória-memória e memória operativa.
Retro é algo que não existe nos jogos actuais. É uma forma de vender memória, vender a nossa infância, como tudo o resto que é "retro". O que encontro nos ditos "jogos indie" ou, vá lá, jogos com uma escala menor, é a crença de que o universo dos videojogos ainda tem muito para me dar e que vou sendo alimentado com novas experiências. Não com novos cenários, não com novas personagens, mas novas formas de me adaptar ao meio-ambiente que alguém criou para mim. É como aprender novas línguas regularmente: e é por isso que acho que actualmente vivemos um período de ouro dos videojogos, onde o divertimento, entretenimento e a satisfação são maiores do que nunca. A única diferença é que já não sou uma criança e tenho de lidar com a memória e isso às vezes ofusca o presente.
E jogo regularmente jogos do passado, não pela memória, mas pelo puro prazer de viver uma história (RPGs) ou ter uma experiência nas minhas mãos, de precisão, frustração e limitação que hoje em dia é impossível de proporcionar. Ler "A Odisseia" não é retro. Jogar "Metroid" em 2013 também não. A tecnologia e os seus avanços obrigatórios é que nos forçam a ver tudo como um passado que só pode ser voltado a viver por um qualquer qualquer mecanismo ou palavra associada à memória. Os atalhos raramente são os melhores caminhos.
Não-Retro
in Artigo